terça-feira, 30 de junho de 2009

MEMÓRIAS DE VIAGEM - PARTE 4

Quando desembarcamos na Barra, em vez de irmos correndo pra casa nos prepararmos para o Sarau, Túlio, com sua latinha de cerveja, Léo, Dora e Apolo inventaram de assistir ao final do show de Téo e o sarau iria ter que esperar. Nunca vi gente tão despreocupada com seus compromissos culturais. Sentei-me numa cadeira nas proximidades e esperei. Chegamos em casa, nos aprontamos e fomos pro bar do sarau, onde chegamos por volta de 20h30. Não havia ninguém. Fomos informados de duas ou três pessoas lá estiveram, mas foram embora por não terem encontrado ninguém. Pra mim tanto fazia, o meu público prometera chegar, ainda que com um pouco de atraso. E realmente chegou. Adriana. Pronto, o sarau estava completo. Como se não bastasse, chegaram duas convidadas dela. A Dani e Maria Rita, ambas de generosas curvas e paisagismo exuberante. Mas, chegaram um pouco tarde, eu já estava apaixonado.

Após algumas declamações que fiz, direcionadas para Adriana e suas colegas, fui muito mal interpretado pelo Léo que acabou por me dar o inconcebível epíteto de “ Taradinho do Pompeu”. Uma injustiça! Logo eu! Mas, vai contrariar conversa de pescador... piora tudo! Deixei pra lá.
Depois das três cervejas de Túlio, algumas poesias, causos e piadas (isso mesmo, Sarau moderno tem piadas.) e alguns refrigerantes, o sarau foi encerrado. Já era quase meia noite.

Quando achei que iríamos pra casa dormir, surgiu a idéia da janta. Não acreditei, Túlio queria jantar. E queria macarrão com churrasco. Meu Deus, onde cabia tudo aquilo? Mais uma vez Léo no indicou o local onde ir. Chegamos lá por volta de uma hora da madrugada. As cozinheiras já estavam sem avental. Voltaram ao trabalho e foram preparar nossa janta. A comida chegou à mesa já eram duas e tanto. Adorei a demora. Adriana foi com a gente e sentou-se bem à minha frente. Comi pouco. Olhar para Adriana me sustentava. A conta não ficou muito alta. Léo não deixou o Apolo pagar sozinho. Fez uma divisão lá, segundo seus critérios de justiça, no qual Adriana nada pagava, eu pouco pagava, ele e Túlio deram não sei quanto e Apolo completou o montante. Léo houvera pedido um desconto, mas o dono do bar se mandou na hora do acerto. Já eram quase três horas e a gente só saiu de lá por que um garçon, velho conhecido do Léo, começou a falar de algumas “estórias” que ele não gostou.

Deitamos às três e às seis a maldita sirene do Léo já nos acordava. Aproveitei que acordado estava e tracei algumas linhas que pensei declamar para Adriana na travessia da ponte que combinamos fazer naquela manhã às 09h00. Acho que era mais ou menos assim:

LEMBRANÇAS:

De Pirapora
levo embora,
bem guardados,
os momentos bordados
pela gratuidade da vida
em rico tecido
do ir e vir das horas.

E se um momento predileto
tivesse eu que escolher,
não seria simples fazê-lo
tal a elegância e o zelo
estampados nos fios
que vida escolheu
para tecê-los.

Mas, por certo,
no oco das horas
que hão de vir,
ao contemplar os fios,
voltarei a me encantar
com o encontro dos rios
que Adriana tem no olhar.

Ao levantar, dobrei o poema, pus no bolso e fiquei esperando pelo encontro. Como nem todo mundo tinha levantado ainda, resolvi ler o poema pro Léo ouvir. Quando terminei, o cara deu uma gargalhada que superou o barulho de seu alarme e todo mundo veio ver o que estava acontecendo. E o Léo foi logo anunciando.

_ Venham ouvir o que o “Taradinho do Pompeu" escreveu!

Recitei a poesia de novo. Todos rimos juntos e o porra do Léo passou a me tratar por “taradinho do Pompeu” .

Daí a pouco eram 09h00 e decidiram que não iríamos mais à ponte naquela hora. Iríamos para a Feira. Virei fera!

_ Feira? E a Adriana? Ela tá lá na ponte me esperando, digo, esperando a gente.

Aí, dispuseram-se então a buscá-la e levá-la para a feira, onde nos encontraríamos. Assim foi feito. Pouco depois que chegamos o Apolo trazia em sua carruagem, a princesa, os pais e o filho dela, um garotão muito bem apanhado, de nome João Guilherme. Não passou cinco minutos e lá veio o Léo.

_ Vem cá, Taradinho do Pompeu. Ocê vai ler o poema da Adriana na frente dos pais dela.

Encarei o bigode do moço (que bigode!), a ternura no olhar da mãe dela e mandei ver. Quando terminei todo mundo bateu palmas e eu ganhei o meu prêmio: Um abraço bem apertado da Adriana, cujo cheiro ainda me perfuma a alma.

O Túlio bebeu suas três cervejas, comeu dois pasteis tipo marmita, aqueles que medem 50 X 50 cm e trazem em seu interior ½ quilo de carne e 750 gramas de batata. Eu tomei um caldo de cana. Lembro-me do rapazinho me olhando de alto a baixo, fazendo uma carinha de dó e perguntando. Tem de R$1,00 e de R$ 0,50. De qual o senhor quer? Nem precisei responder. Ele já tava com o copo de R$0,50 na mão. A feira me pareceu muito legal, mas o mais importante que vi lá foi, com certeza, o ponto de leitura organizado pelo Léo do Peixe. Muitos jovens, muitas crianças e muito idosos lá chegavam, alguns com sacolas, para trazer e levar livros emprestados. Comovente! Não ficamos muito tempo. Deixamos o Léo cuidando de sua clientela e tratamos de ir pra ponte. Como era muita gente, o Apolo levou primeiro eu e a Dora. Nos deixou na ponte e voltou para apanhar o resto do pessoal. Atravessamos a ponte e nos sentamos numa pracinha em Buritizeiro. Onde a Dora me deu a honra de discorrer com ela sobre a complexidade dos seres humanos. Aprendi muito. Quase meio dia, num dado momento, Dora apontou alguma coisa e disse:

_ Olha lá na ponte. Eu tô vendo o vermelho da blusa do Apolo.

Olhei pra onde ela apontou e perguntei:

_ Uai, cadê a ponte?

Em alguns minutos chegou a galera, iluminada pela aura da Adriana e refletida na latinha de cerveja do Túlio.

Sentamo-nos em um bar de Buritizeiro e pedimos alguns refrigerantes e cerveja pra Túlio. Concedemos ao Apolo o direito a meio copo de cerveja, limite legal para quem iria dirigir dentro de meia hora, quando deixaríamos a cidade. Eu duvidei, mas o Apolo conseguiu arrancar o Túlio da cadeira antes da quinta “saideira”. Fizemos a travessia de volta e nos despedimos. Abracei a todos antes da Adriana. O abraço dela teria que ser o último, para eu trazer o seu cheiro comigo. Saímos de Pirapora às 13h18 e chegamos em Sabará às 18h00. No caminho para o Pompeu, Apolo teve que fazer uma parada de emergência para que Túlio se desfizesse do excesso de cerveja ingerido no transcurso.

Em casa, não tinha cerveja, Túlio fez uma cara de nojo, mas tomou café mesmo. Falei de Adriana pra minha mulher, com este comentário:
“ se a gente ficasse por lá mais dois dias, ia ser difícil eu voltar “.


...continua.

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